Postado por Andre Carvalho
em quarta-feira, 16 de outubro de 2013.
Certamente épico não é o adjetivo adequado para esta maravilha do Zorn, até porque o termo épico sempre me faz saltar na cabeça a imagem do Conan. O certo é que parece ser impossível a reunião de Ribot, Rob Burger e Kenny Wollesen não produzir algo singelo e grandioso ao mesmo tempo.
Em julho de 2008, Zorn foi informado por Ribot que sua querida amiga e diretora Natalia Almada estava considerando chamar Zorn para compor a trilha sonora de seu próximo filme, um documentário sobre a vida do general mexicano Plutarco Elias Calles. O general Plutarco Elias Calles governou o México no período da Guerra Cristera, entre 1926 e 1929, guerra essa que teve origem quando em 1917 houve mudanças na constituição que retiravam e muito a influência da igreja sobre o estado. Os cristeros, como assim se auto-proclamavam, pois acreditavam estar lutando pelo prórpio Jesus Cristo, se rebelaram contra estas mudanças; depois de um longo período, quase uma década depois das mudanças constitucionais, a guerra eclodiu. Os 3 anos que se seguiram de conflitos deixaram cerca de 90 mil mortos.
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Zorn havia composto recentemente outras trilhas sonoras, e estava finalizando alguns projetos, por isso deixou Natalia procurar por outros compositores que pudessem aceitar o trabalho, sem contudo abandonar o projeto em definitivo, deixou uma porta aberta para caso a diretora ainda necessitase contar com ele.Cinco semanas após Zorn ter tomado esta decisão seu telefone tocou, era Ribot pedindo um favor, Natália foi infeliz em conseguir outro compositor para a trilha de seu documentário. Sendo Ribot como disse Zorn, um dos seus mais queridos amigos e um dos seus colegas mais íntimos, sentiu um peso de responsabilidade pelo projeto e o aceitou mesmo com certo receio.
Natalia era relutante em se usar música tipicamente mexicana na trilha, "nada de mariachis, rancheras ou música norteña". A diretora queria algo mas minimalista "como Phillip Glass, e não tão dramática". A música pensada e escrita por Zorn era muita mais abstrata, colorida e dramática do que a preterida pela diretora, "mas não uma dramaticidade ingênua, uma dramaticidade que demonstrava o constante diálogo entre a luz e a escuridão, o bem e o mal". De fato, a metáfora é um gênero de linguagem muito pobre tanto para a música como para o cinema (isso não impede que com maestria alguns diretores/escritores a consigam usar muito bem), mas na maioria dos casos é sempre desastrosa. Vejam só o caso do tão aclamado livro "A Revolução dos bichos" do Orwell; mesmo o escritor tendo intencionado dar um caráter totalmente didático a obra, literiariamente A revolução dos bichos é extremamente pobre, e mesmo em se tratando de uma crítica a um regime político, a mesma ainda é carente e superficial; a metáfora parece estar tão intrincada na mente do autor que a obra já nasceu absolutamente limitada; porque não citar "A longa jornada" do Richard Adams então como crítica de alguma coisa e de algum regime? O livro em questão de Adams não lida com metáforas óbvias e pobres e por isso vai mundo mais fundo na psicologia e mazelas da alma humana, organização da sociedade civil e tudo o mais. Antes, Adams investe sobre as impressões de situações, como lidamos com dados contextos. A ligação de tudo isso com o álbum do Zorn é que não há metáforas pobres, os temas mexicanos não aparecem para compor uma história e um cenário tipicamente mexicano. Bejos de Sangre por exemplo, consegue de uma forma quase inimaginável nos por nesta situação de bem e mal, luz e escuridão citada por Zorn. Nós viajamos ao México do ínicio do séc. XX, sem dúvidas, mas não vamos através de "pontes" fracas e imediatistas, e sim através de profundas impressões, nos guiando puramente pelo sentimento.
Um dia antes de entrar em estúdio para gravar o álbum Zorn mandou um e-mail alertando para Natalia a disparidade da música a qual ela desejava da música pensada por ele, perguntando se ainda assim poderiam gravar ou não. A resposta da diretora foi dada em uma palavra: "Adelante!"
Mas, o desfecho da história não foi o esperado; Natalia havia contratado um outro músico as escondidas para compor a trilha, e somente 3 das 10 faixas compostas por Zorn e companhia foram utilizadas no filme. Zorn simplesmente brincou com a asituação, dizendo ser a moral da história: "Confie nas suas primeiras intuições".
Bass – Greg Cohen
Guitar – Marc Ribot
Marimba, Vibraphone, Drums – Kenny Wollesen
Piano, Accordion – Rob Burger
Composed, Arranged, conducted and produced by John Zorn